A UNIDADE: FRUTO AMOR RECÍPROCO
“Onde dois ou três estiverem reunidos no meu nome, ali estou eu no meio deles.”(Mt 18,20)
Esta palavra, que está no coração do Evangelho de São Mateus, é como a porta do Paraíso na terra, o grande segredo espiritual para viver desde já como no Céu!
É maravilhoso descobrir como o Senhor quis permanecer presente na terra de tantas formas, pois a Sua Presença vale mais do que a vida, e sem a sua Presença a vida não é vida plena: sem Ele nada podemos fazer (cf. Jo 15,5).
Existe, porém, uma modalidade que contém uma graça toda particular e que, de alguma forma podemos experimentar continuamente através do amor fraterno: “onde dois ou três estiverem reunidos no meu nome, ali estou eu no meio deles”.
Chiara Lubich, fundadora do Movimento dos Focolares, que tem encontrado nesta presença de “Jesus no meio” de nós a luz do seu carisma, dizia: “Jesus no meio de nós nos dá o Paraíso na Terra e na outra vida… quando Jesus está no meio de nós é sempre festa”.
Tertuliano (um dos grandes Padres da Igreja) dizia: “onde dois ou três estão reunidos, mesmo que leigos, aí está a Igreja”.
É importante entender a centralidade deste mistério no Evangelho de São Mateus, chamado o evangelho do “Emanuel” (Deus conosco).
O Emanuel
De fato, todo o seu Evangelho é centrado sobre o mistério da encarnação de Jesus Cristo, que realiza as promessas do Antigo Testamento e torna plena a Presença de Deus no meio dos homens: um Deus de Aliança, Deus de Promessa, Deus presente na história do seu povo, Deus fiel e Salvador!
Por isso, encontramos a revelação do “Emanuel” no começo, no fim e no meio do Evangelho.
- no 1º capítulo: “Eis que a virgem conceberá e dará a luz um filho, e o chamarão com o nome de Emanuel que significa DEUS CONOSCO” (Mt 1,23);
- no final do Evangelho, em seu último versículo: “E eis que ESTAREI CONVOSCO todos os dias, até a consumação dos séculos” (Mt 28,20);
- e no centro, no coração do Evangelho: “Onde dois ou três estiverem reunidos no meu nome, ali ESTOU EU no meio deles” (Mt 18,20)
“Onde dois ou três estiverem reunidos no meu nome, ali estou eu no meio deles.” (Mt 18,20)
Como poderemos então viver sempre na Sua Presença? Como fazer da nossa vida uma festa? A Palavra nos ensina e os Padres da Igreja nos explicam de forma admirável, alguns passos para caminharmos sempre com Jesus no nosso meio, como os discípulos de Emaús (cf. Lc 24, 13ss).
1º PASSO: “se dois de vós estiverem de acordo…” (Mt 18,19). O “acordo”, a sintonia de sentimentos, escolhas, a unidade de coração, de alma, de pensamento.
É esta a primeira condição para vivermos sempre com esta Presença. Diz Orígenes: “a concórdia une e contém o filho de Deus. Cristo, onde vê dois ou três unidos no seu nome, vai aí no meio deles, atraído pela sua fé e provocado pela sua unanimidade”.
Este passo comporta então a escolha do amor recíproco e de manter a unidade entre nós como o mais precioso tesouro da nossa vida evangélica.
2º PASSO: “se dois ou três estiverem reunidos no meu nome…”. Biblicamente, “estar unidos no nome de Jesus”, significa estar reunidos no seguimento do Cristo = na sua vontade que é a Vontade do Pai.
Ou seja, buscar acima dos nossos desejos e vontades pessoais a vontade do Pai, na escuta da sua Palavra, no discernimento comunitário, na escolha pessoal de fidelidade aos seus mandamentos.
Isto não é tão comum. Escreve São João Crisóstomo:
“Que então não existem dois ou três unidos em nome de Deus? Existem, mas raramente. Porque não é apenas uma reunião material. Significa: se alguém me considera como causa principal do seu amor para o próximo, Eu estarei com ele. Agora, um ama porque é amado. Um outro ama porque tem utilidade. Mas é difícil encontrar alguém que ame por Cristo. Quem ama assim, embora odiado, amaldiçoado, ameaçado de morte, insultado, continua amando porque Cristo amou os seus próprios inimigos”.
3º PASSO: a prática recíproca do perdão e da correção fraterna. Sempre digo que a Palavra de Mt 18,20 é como uma “pérola” preciosa contida entre duas “conchas” = Mt 18,15-18, que nos ensina a vivermos a correção fraterna e o trecho de Mt 18,21-35 que nos ensina a perdoarmos até setenta e sete vezes.
Aqui, o Senhor condiciona o seu perdão à medida do perdão que nós damos para os outros pois é perdoando que somos perdoados!
O que isto significa concretamente? Significa que só podemos permanecer unidos pela humildade de nos reconhecer pecadores, na busca de uma contínua conversão, pela Misericórdia vivida concretamente nos nossos relacionamentos fraternos.
Amor ferido
De fato, depois do pecado original o nosso amor é um “amor ferido” que o Senhor quer curar pela ferida do Seu Coração.
Ele chama cada um de nós a sermos canais do seu perdão para os outros, expressão do seu amor que perdoa, corrige e renova a confiança. Humildade e Misericórdia são, então, o segredo para manter entre nós, pobres, pecadores, perdoados (como diz o Papa Francisco), a unidade e a concórdia que “atrai e contém” o Filho de Deus entre nós!
“Onde dois ou três estiverem reunidos no meu nome, ali estou eu no meio deles.” (Mt 18,20)
Quando Jesus está entre nós tudo se transforma, se ilumina, sentimos paz, alegria, vida, força nova, ousadia como os discípulos de Emaús. Jesus “em pessoa” se faz presente no meio de nós.
Se antes estávamos cegos, com medo, tristes, sem fé, sem confiança, desiludidos, a experiência da Sua Presença abre os nossos olhos, faz arder os nossos corações, ilumina a Escritura sagrada, transmite direção, força, alegria e nos torna testemunhas da sua Presença no meio dos homens: “É verdade, o Senhor ressuscitou” (cf. Lc 24,13-35).
Lembro de um casal que sempre procurava viver com Jesus Presente no meio deles. Quando o pai levava as crianças para descansar sempre dizia ao apagar a luz do quarto: “Vamos dormir com Deus”!
Mesmo quando havia alguma briga ou desentendimento, o casal procurava reconciliar-se logo. Como diz São Paulo em Efésios, no capítulo 4, não queriam deixar o “sol se pôr” sobre seus desentendimentos, para não deixar lugar para o diabo.
Uma noite, porém, houve uma briguinha entre os pais e os dois não souberam pedir-se perdão. Quando o pai levou as crianças para dormir, não teve então coragem para dizer-lhes: “Vamos dormir com Deus”, pois Jesus já não estava mais presente no meio dele. As crianças, porém, perguntaram: “Pai, hoje não vamos dormir com Deus”?
O pai, tocado pelo amor dos seus pequenos foi então reconciliar-se com sua esposa. A paz voltou nos seus corações e com a paz, a Presença de Jesus. Aí o pai voltou no quarto e disse com o coração alegre: “Agora podemos dormir com Deus”.
Realmente a Presença de Jesus no nosso meio traz o Paraíso na terra. Busquemos, pela força desta Palavra, não perder esta graça. Termino com um texto de Chiara Lubich que pode nos ajudar numa atitude de vigilância e amor para que Jesus sempre permaneça presente no meio de nós.
“Sozinhos, se percebia toda a nossa fragilidade. Percebíamo-nos perdidos, com uma vontade fraca; não se compreendia porque ter que deixar tudo para seguir a Jesus. Ao ficarmos unidos, pelo contrário, se percebia toda a força de Jesus entre nós. Éramos envolvidos pela potência e pela benção do céu e nos percebíamos capazes das ações mais nobres para Deus, dos mais ardentes e difíceis propósitos que depois, eram mantidos, enquanto antes, sozinhos, era difícil chegar ao cumprimento das promessas feitas a Deus. Se estamos unidos, Jesus está entre nós e isso vale. Vale mais do que todo tesouro, mais do que a nossa própria alma”.
Pe. João Henrique
Fundador da Aliança de Misericórdia
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