A vocação sacerdotal nos dias atuais
“Jesus escolheu os doze para que permanecesse com ele e os enviou para pregar”. (Mc 3,13-14)
O chamado ao sacerdócio nasce do coração de Jesus, Ele que, querendo precisar de homens como ministros do seu Evangelho, escolheu aqueles que “Ele quis” (Mc 3,13) para que o seguissem como seus discípulos e ensiná-los a serem como Ele, a se configurarem ao seu modo de viver.
Depois da última Ceia, momento sublime onde Jesus institui o mistério admirável da Eucaristia, institui também ao mesmo tempo do Sacerdócio, pois ao dizer: “isto é o meu corpo”; “este é o cálice do meu sangue”, disse também: “Fazei isto em memória de mim” (Lc 22, 18-19).
Ou seja, para perpetuar o seu próprio ministério de salvação, Jesus encarrega seus discípulos a celebração do seu Mistério Pascal através dos Sacramentos, sobretudo da Eucaristia.
Perguntas pertinentes
Assim, a partir de Jesus, passando pelos seus apóstolos, o sacerdócio foi sendo transmitido de geração em geração até os dias de hoje. Mas, aqui podemos nos perguntar: algo que nasceu há mais de dois mil anos, em um tempo e cultura completamente diferente de nossa realidade atual ainda continua valendo?
Ainda faz sentido para um mundo pós-moderno marcado pela revelação da indústria, da tecnologia, da informática e dos meios de comunicação? Com todas as transformações sociais que ocorrem ao longo dos séculos, poderia algo tão antigo dar respostas para as questões mais profundas do homem do Século XXI?
Em uma época da história onde procura-se dizer que o homem não precisa mais de Deus nem da religião, mas pelo contrário, que precisa se libertar desses paradigmas para encontrar a sua plena realização, para ser verdadeiramente livre, teria ainda alguma utilidade o sacerdócio cristão católico?
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O coração humano
Bom, um ponto que pode ser nossa referência de partida, ao meu ver é: todo ser humano, em qualquer momento da história e independente de sua cultura, possui dentro de si um anseio pelo eterno, pelo absoluto, pelo transcendente.
Somos um ser que busca o infinito. Para nós cristãos é muito claro que essa busca tem como objetivo alcançar Deus que é o absoluto de todas as coisas. A história das religiões demonstram isso; as Escrituras Sagradas nos revelam esse anseio:
“Senhor é vossa face que eu procuro, não me escondais a vossa face” (Sl 26, 8-9); no Evangelho, vemos experiência de alguns gregos (nativos do berço da filosofia) que dizem: “Queremos ver Jesus” (Jo 12, 22).
Sinal de Deus
Diante disso, é que me sinto na tranquilidade de afirmar que hoje, a vocação ao sacerdócio continua sendo não somente válida, mas extremamente necessária, pois, apesar de todos as transformações da história, com tudo aquilo que parece avanço, evolução, o ser humano ainda continua – talvez mais do que nunca – desorientado, em busca de questões profundas que a ciência não consegue resolver.
Frequentemente o ser humano se depara com o vazio existencial, com o desespero, a falta de esperança e perspetiva de vida por ter abandonado à Deus.
Precisamente aqui, no hoje da nossa história, entra a figura e o papel do sacerdócio, que, dentre tantas atribuições, tem, a missão de tornar-se um símbolo da visibilidade de Deus, por isso, como disse Bento XVI: “esta é tarefa principal do sacerdote: levar Deus os homens” como também de levar os homens à Deus, o reiterando no Coração de Deus.
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Uma vocação imcompreendida
Viver a vocação sacerdotal é hoje um grande desafio pois, em um mundo secularizado, esse ministério sofre uma grande incompreensão por parte do mundo. E isso não é de agora, Jesus já havia previsto aos discípulos ao dizer-lhes:
“Se o mundo vos odeia, sabei que, antes de vós, odiou a mim. Se fôsseis do mundo, ele vos amaria como se pertencêsseis a ele” (Jo 15, 18-19). Sobre esse tema, ainda diz bento XVI: “O mundo não quer conhecer a Deus para não ser perturbado pela sua vontade, e por isso não quer ouvir os seus ministros”.
Contudo, mesmo diante das possíveis indiferenças, do desprezo, perseguições, ainda que até à morte, vale a pena dedicar-se ao anúncio do Evangelho por meio do ministério sacerdotal, cientes que as ofensas e rejeição que possam acontecer são no fundo um clamor de desespero, um grito que brotam de um profundo vazio, de um coração sedento para ver Jesus.
O desespero de uma grande multidão que ainda se encontra como ovelhas sem pastor, (cf. Mt 9,6) mas que são objeto do olhar misericordioso do Senhor que, ao mover-se de compaixão, enviou seus sacerdotes como Ministros da Misericórdia para resgatar o que estava perdido e precisa ser reencontrado, o que estava morto e precisa voltar a viver (Lc 15, 24).
O que foi decisivo no meu chamado?
A resposta à vocação sacerdotal em minha vida se deu pela soma de alguns fatores, de experiências que vivi em minha juventude.
Em primeiro lugar a experiência com os pobres, com moradores de rua que, ao me aproximar para falar e orar com eles, às vezes oferecendo um alimento um cobertor, pela boca deles, sem me conhecerem, Deus me chamou.
Depois, servindo à Deus na Igreja, foi percebendo dentro de mim que Deus queria sempre mais, por mais que eu me entregava, sentia que Deus não estava apenas me pedindo muito, mas tudo;
Outro fato, até inusitado, foi o primeiro dia em que coloquei a dúvida sobre ser padre. Estava ouvindo um Bispo fazer a homilia, mas, pensei: “Ele está usando uma linguagem muito difícil, que pena desses idosos, será que o entendem?” Então pensei: “se por acaso eu fosse padre, tentaria falar de modo que as pessoas possam entender”.
Naquele dia, o padre daquela Paróquia me perguntou: “Você já pensou em ser padre? Então, lhe disse: “Até então não, mas hoje pensei pela primeira vez”.
Enfim, para mim foi impossível dizer não, pois a voz do Senhor que ressoava em meu coração era irresistível, como disse o profeta Jeremias: “era como um fogo ardendo em meu coração, tentei resistir mas não consegui” (cf. Jr 20,9)
Qual o maior desafio nos dias de hoje?
Creio que o grande desafio é não se deixar influenciar por este mundo consumista e materialista que tenta nos seduzir com tantos prazeres e compensações materiais; o desafio é não deixar-se secularizar pelo mundo, mas santificá-lo pelo exercício de uma profunda vivência da espiritualidade sacerdotal; além disso, como viver o sacerdócio de modo a impactar o mundo necessitado de uma profunda transformação.
Pe. Evandro, missionário de vida e vice-presidente do Movimento
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