Um território que, por anos, foi chamado de casa. Ruas que guardam memórias, histórias, afetos e lutas. Um espaço que hoje se despede do concreto, mas permanece vivo no olhar de quem o habitou. Assim nasceu a exposição “Olhares que Falam”, fruto de uma oficina de fotografia com 38 adolescentes, entre 12 e 15 anos, atendidos pelo CCA São Domingos Sávio, projeto do Oratório da Aliança de Misericórdia na comunidade do Moinho, em São Paulo.

A abertura da mostra aconteceu no último dia 20 de setembro, no Sesc Bom Retiro, e apresentou ao público imagens que são mais do que registros fotográficos: são memórias, sentimentos e testemunhos de quem cresceu em meio às transformações da comunidade — hoje em processo de desapropriação.

“É muito interessante pensar que aquele curso de fotografia, que há pouco tempo caminhava pelas vielas do Moinho, se transformou nessa exposição tão potente. Cada imagem conta uma história e constrói uma narrativa sobre esse espaço que, em breve, pode deixar de existir — e que, para muitos desses jovens, já não existe mais”, explica o fotógrafo e curador Rodrigo Koraicho.

Rodrigo, que desde 2019 acompanha de perto a realidade do Moinho, relata que a ideia do curso sempre esteve presente, mas ganhou urgência com a notícia da remoção das famílias. “Queríamos que eles mesmos fotografassem o lugar onde nasceram e cresceram, para que essa memória não se perdesse. Hoje, essas imagens se tornam parte da história da cidade e da luta de quem resistiu aqui”, completa.

Um olhar que permanece

Para a Aliança de Misericórdia, a exposição é também um marco de presença e missão. Há 21 anos atuando na comunidade, a instituição sempre buscou estar próxima das famílias em situação de vulnerabilidade, seja por meio da creche, do Oratório ou da presença missionária.

“Ver esse trabalho ganhar vida nessa exposição é emocionante. É a expressão daquilo que vivemos nesses anos todos: um compromisso real com as pessoas e com o território. A fotografia deu voz aos jovens, mostrou que suas histórias importam e precisam ser lembradas”, afirmou Élida de Freitas Fernandes, diretora do CCA.

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Memórias em cada clique

Para os adolescentes que participaram do projeto, cada fotografia carrega um pedaço da própria vida.

Diego, um dos jovens fotógrafos, contou emocionado sobre sua imagem: “Eu tirei uma foto que parece um olho se abrindo e vendo os telhados. Foi difícil subir no alto do prédio para fazer, mas valeu a pena. Fico feliz de ver minha foto no Sesc. Significa muito para mim, porque esse lugar vai deixar de existir. Aqui eu nasci, vivi e cresci. Tive momentos felizes e tristes. Agora fica essa lembrança.”

Outro jovem também compartilhou o significado de sua foto, tirada em frente a uma igreja que marcou sua história: “Essa igreja ajudava todo mundo. Fui coroinha lá e vivi muitas coisas importantes. Agora que será demolida, essa imagem é um pedaço de mim que fica para sempre.” 

Um oratório onde a esperança floresce

O projeto foi desenvolvido no Oratório São Domingos Sávio, um dos Centros para Crianças e Adolescentes (CCA) mantidos pela Aliança de Misericórdia na Favela do Moinho. O CCA é um espaço socioeducativo que acolhe diariamente cerca de 120 crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social.

Ali, no contraturno escolar, são oferecidas oficinas de leitura, escrita, artes, esportes, atividades culturais e vivências espirituais. No entanto, mais do que atividades, o que se oferece é um espaço de escuta, acolhimento e resgate da dignidade.

Quando a arte evangeliza

Mais do que um projeto artístico, “Olhares que Falam” é um testemunho vivo de fé e esperança. É a prova de que Deus também se revela nas pequenas histórias, nos sorrisos e nas lágrimas de quem continua acreditando no futuro, mesmo quando o presente parece se desfazer.

As imagens produzidas pelos adolescentes do CCA São Domingos Sávio seguem em exposição até o dia 30 de novembro no Sesc Bom Retiro, em São Paulo. A entrada é gratuita. Endereço: Al. Northmann, 185 – Bom Retiro, São Paulo/SP.