Santo Agostinho e a doutrina do livre-arbítrio: Liberdade com responsabilidade e graça

Entre os grandes mestres da fé cristã, Santo Agostinho de Hipona se destaca como um dos mais profundos pensadores sobre o mistério da liberdade humana. Em sua obra, especialmente nos escritos De libero arbitrio (“Sobre o Livre-Arbítrio”), ele desenvolve uma doutrina sólida e espiritualmente rica sobre o dom que Deus concedeu ao homem: o livre-arbítrio.

O que é o livre-arbítrio?

Para Santo Agostinho, o livre-arbítrio é o dom que Deus concedeu ao ser humano de escolher entre o bem e o mal. Trata-se de um reflexo da nossa criação à imagem e semelhança de Deus (cf. Gn 1,26), que nos torna responsáveis por nossas ações.

Em sua obra De libero arbitrio, ele escreve:

“Sem o livre‑arbítrio não haveria mérito nem desmérito, glória nem vitupério.”

Essa liberdade, no entanto, não é absoluta. Santo Agostinho explica que o homem, ao usar mal essa liberdade e voltar-se para si mesmo, dá origem ao pecado. O mal, segundo ele, não é uma criação de Deus, mas a ausência do bem, causada pelo mau uso da vontade humana.

Livre-arbítrio e graça de Deus

Após sua conversão, Santo Agostinho percebe que o livre-arbítrio, por si só, não basta para escolher o bem com plenitude. A liberdade humana, ferida pelo pecado original, ficou inclinada ao erro. Por isso, ele afirma: precisamos da graça de Deus para escolher o bem verdadeiro.

“Dá-me o que mandas, e manda-me o que quiseres.” (Confissões, X, 29)

Essa oração revela uma teologia profunda: a graça não destrói a liberdade, mas a cura e a fortalece. A graça antecede e acompanha nossas boas obras, fazendo com que possamos verdadeiramente querer e fazer o bem.

O Catecismo da Igreja Católica confirma essa visão:

“A liberdade é no homem uma força de crescimento… atinge sua perfeição quando está ordenada para Deus.” (CIC §1731)
“Sem a graça, o livre-arbítrio não pode retornar à justiça.” (CIC §1732)

A liberdade como resposta amorosa

Para Santo Agostinho, a verdadeira liberdade está em escolher amar e servir a Deus. Isso parece contraditório ao pensamento moderno, que entende liberdade como “fazer o que quiser”. No entanto, para o cristão, ser livre é viver a verdade do Evangelho.

Em Gálatas 5,1, São Paulo afirma:

“Foi para a liberdade que Cristo nos libertou.”

Mas essa liberdade exige que vivamos segundo o Espírito (cf. Gl 5,16). Ou seja, a liberdade cristã está ligada à conversão contínua, à vida de oração e à abertura à graça de Deus.

Responsabilidade moral e santidade cotidiana

Santo Agostinho também nos ensina que, por termos livre-arbítrio, somos moralmente responsáveis por nossas escolhas. Isso tem um grande impacto na vida de santidade: não somos movidos por instintos ou forças cegas, mas somos livres para escolher amar, servir, perdoar e evangelizar.

Essa é uma mensagem central no carisma da Aliança de Misericórdia: anunciar que cada pessoa tem o poder de recomeçar, com a ajuda da graça, fazendo novas escolhas e caminhando rumo à santidade.

Liberdade com responsabilidade e fé

A doutrina católica do livre-arbítrio, iluminada por Santo Agostinho, nos ensina que somos livres, mas não sozinhos. Deus nos chama a usar nossa liberdade para amá-Lo e amar os irmãos. E quando caímos, Sua graça nos ergue, cura nossa vontade e nos faz caminhar novamente.

Que possamos, como Santo Agostinho, viver a liberdade verdadeira: aquela que nos une a Deus e transforma o mundo com a força do amor e da misericórdia.

 

 

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